
PASSADO NÃO DÁ FUTURO
Remoer coisas do passado, deixar-se prender por mágoas ouressentimentos, ficar a atormentar-se com os erros e viver obcecadocom aquilo que nunca mais volta não é, definitivamente, a melhormaneira de existir.
Ficar preso ao passado é uma expressão eloquente na medida em quedefine, à partida, a condição do prisioneiro, de alguém que viveamarrado a qualquer coisa que o deixa sem liberdade ou margem demanobra.
Ficar preso ao passado é isso mesmo, é ficar de pés e mãos atados semconseguir dar um passo em frente.Acontece-nos a todos atravessar fases em que o passado tem muito maispeso do que o presente, alturas da vida em que a única certeza quet emos é aquilo que já vivemos.
É natural que assim seja e é, até,saudável acumular memórias para recordar quando vier a propósito.O que se torna doentio e pode revelar-se um verdadeiro atraso de vida,é transformar o passado em presente e, em casos agudos, deixar queseja o passado a servir de molde ao futuro.Muitas pessoas carregam consigo um enorme fardo onde se misturam experiências, sentimentos e emoções vividas mas onde prevalececlaramente a vontade de recuperar aquilo que jamais voltará.Manter viva a memória das coisas e das pessoas que amamos é essencial,dá outra poesia à vida e implica uma atitude construtiva. Sábia,porventura. Já a tendência para desejar permanentemente que o tempovolte atrás é um comportamento redutor e muito pouco saudável.Muitas pessoas foram ricas durante grande parte da sua vida e, um dia perderam tudo; muitos viveram anos a fio com as pessoas queverdadeiramente amavam e, de repente, perderam-nas para sempre; muitos estiveram 'em alta' e, por força das circunstâncias várias, passaram aestar 'em baixa' e por aí em diante. Os exemplos podiam suceder-se atéao infinito porque, na verdade, seja por acidente, morte, doença,sorte ou azar todos perdemos e ganhamos e todos vamos acumulando um passado.
A única certeza que temos é que arrumando bem este passado individual seremos capazes de viver bem o presente e olhar para ofuturo com confiança.Arrumar o passado não quer dizer esquecer e, muito menos, apagar oufingir que nunca existiu. Pelo contrário, arrumar quer dizer issomesmo. Significa deitar mãos à obra, olhar para cada coisa, pegar-lhe com cuidado e atribuir-lhe, primeiro, uma importância e, depois umagaveta.
Como um sótão que se arruma mantendo intactas todas as peças e,até, alguma poeira que o tempo acumulou. Ninguém deve limpar o chão de um sótão antigo com baldes de lixívia e uma escova dura. Um sótão bonito e cheio de preciosidades arruma-se com cuidado, resistindo à tentação de varrer as sobras para um canto, ou pior, para debaixo dotapete. Separa-se o que não interessa ou já não em utilidade edeita-se o lixo no lixo. É exactamente isso que devíamos fazer com onosso passado. Separar o que não interessa, arrumar muito bem nasgavetas os pequenos e grandes tesouros e deitar o lixo no lixo. Só assim o passado pode dar futuro.
Laurinda Alves - Xis ideias para pensar